Seria Old Dragon um D&D da velha guarda?

olddragonQuando começaram a falar sobre esse negócio de fazer um encontro de RPG Indie eu pensei logo que deveria existir um D&D indie, e pela definição a que a gente chegou, pequenas editoras são indie, então minha escolha só poderia ser Old Dragon!

Esse RPG brasileiro, feito pelo Antônio Sá (Paragons) e do Fabiano Neme (Vorpal), é uma volta às antigas edições de Dungeons & Dragons, como era jogado até os anos 90. Mas apesar de parecer uma contradição, o sistema é muito simples, e o material é especialmente bom se você quer começar a jogar ou mestrar e nunca fez isso antes. No site há fichas para download, um manual fast play, suplementos e aventuras grátis, e até mesmo um guia para fazer personagens passo a passo.

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Arte de Alexandre Togeiro para Old Dragon

Não vou fazer uma resenha, Old Dragon foi lançado em novembro e você pode achar um monte de resenhas usando o Google.

O livro-básico começa assim: “Old Dragon é um RPG de fantasia medieval de capa e espada, contruído tomando por base as versões mais antigas do RPG de fantasia mais famoso do mundo, seguindo a tradição old school desse tipo de jogo.”

sword-wizardryNa verdade, o que os meninos fizeram foi uma esperteza e tanto, pegaram a licença OGL do sistema d20, e recriaram um misto de AD&D e experiências mais recentes em RPG. É mais ou menos o que o pessoal do Swords & Wizardry fez, chamando seus jogos de retro-clones de D&D. O Paragons inclusive divulgou uma tradução do S&W, pra irem jogando enquanto o Old Dragon não saía.

Mas por que essa nostalgia e uma certa birra com a 3a e 4a edições do D&D? E o que é toda essa discussão sobre RPG old school?

Para mim a 3a edição foi uma redescoberta, porque fazia mais de uns 5 anos que eu não jogava D&D quando aqueles livros lindos chegaram na minha casa. Me lembro eu e um outro mestre, Pai Thomas, vendo aquilo e dizendo, “me deu vontade de jogar de novo”.

Hoje Pai Thomas joga 4a edição, enquanto o irmão dele, que joga old school só porque não teve tempo de aprender as novidades, ainda joga AD&D 1a edição.

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Um dos produtos mais legais: Grids Old Dragon

Mas vou contar pra vocês, o pessoal que defende o jogo mais Velha Guarda tem razão em algumas coisas. Quando vejo os jogadores falando “vou rolar um spot”, em vez de “como é a sala”, penso que perdemos um pouco realmente.

Dungeon Crawl Classics

A série Dungeon Crawl Classics faz aventuras da velha guarda para qualquer sistema de D&D.

Tenho um amigo, o SSS, que nunca pôs a mão nas novas edições pra mestrar, e sempre discordamos nisso. Mas fui perguntar pra ele por quê, exatamente pra escrever pra vocês, e ele me disse isso:

“Na verdade, algumas coisas são mais simples, é um pouco mais livre de regras e, pessoalmente, prefiro personagens mais simples, mais “humanos”. Acho o sistema de perícias e conhecimentos mais aberto, abrangente: você não sobe skills a cada nível, mas o que sabe fazer, geralmente sabe bem. E não é tão difícil ter skills não relacionadas diretamente à sua profissão (como o guerreiro que sabe caçar ou pescar bem). Fora isso, são mais escolhas pessoais…”

suplementos

Suplementos grátis do Old Dragon

De fato, o sistema de perícias de Old Dragon nem aparece no livro básico, como no D&D original, ele é opcional e pode ser baixado gratuitamente, o que simplifica bastante as regras principais. Os personagens só rolam HP até o 10o nível, o que retira um pouco da sensação de poder demais, que SSS também reclama.

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A divisória pequena me deixou bem feliz, eu gosto de olhar por cima, e essa é perfeita

Coisas como o THAC0 e os Saving Throws sumiram, que eram o maior mistério dos antigos D&D, herança dos sistemas complexos de wargames. As Proficiências do antigo D&D mantiveram seu funcionamento, mas as novas estão lá se você quiser testá-las.

Mas acho que o principal é a ausência de muitas regras, principalmente orientadas pro combate em tabuleiro. A idéia defendida pelo pessoal da velha guarda do D&D, e que está presente no Old Dragon, é que o mestre tem o controle da situação. É ele que diz se isso pode ou não, ou a maneira como pode ser feito, e a dificuldade. Dificilmente um jogador vai citar uma regra da página 247 sobre combate submarino, porque isso vai ser criado com o jogo em movimento.

Miniaturas

Estão fazendo miniaturas old school???

Me lembro do aviso clássico do Shadowrun 2a edição: “Se você não gostar de uma regra aqui, mude. Ninguém vai bater na sua porta para saber se você está jogando pelas regras oficiais de Shadowrun. Nós paramos de fazer isso muito tempo atrás!”

Talvez as novas edições de D&D tenham deixado a gente um pouco relaxado, e quero ver se consigo rever isso, e reconquistar aquela sensação de deslocamento que eu tinha quando jogava com meus amigos nos porões da UnB.

Quem quiser se aprofundar na questão, tem um artigo ótimo sobre RPG de velha guarda: Quick Primer for Old School Gaming, escrito pelo Matthew Finch, um dos fundadores da Mythmere Games. Aliás, essa coisa de comunidade é muito interessante, e já estão pintando coisas caseiras para Old Dragon, como esse Cavaleiro feito pelo Clérigo.

ML

ML no lançamento da Red Box na GenCon 2010: "seria o D&D Essentials old school?"

ML curte matar dragões old-style, curte regras soltas, mas nunca entendeu direito regras sobre Save Versus Paralize, Getting Into a Grab, Stand Up From Prone, e Magic Throwing Weapons.

E para divertir nossos leitores, um comercial old school:

 

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Sobre ML

M L escreveu 150 posts neste blog.

Gosta de fazer intriga em seus jogos, botar medo nos jogadores, e está sempre à procura do sistema perfeito de RPG.

Comments

  1. Então, eu acho que o conceito de fantasia medieval se perdeu nos livros da linha D&D.
    O D&D primeira edição tinha a parcela de fantasia mas era ofuscado pelo modo de jogo ” matar e pilhar “.
    O Ad&D estava com a parte de fantasia medieval na medida, com e o ” matar e pilhar ” era uma OPÇÃO, não uma obrigação. Infelismente o sistema era “travado” demais para permitir uma liberdade alta para os jogadores e mestre.
    O 3.o / 3.5 veio para revolucionar, e revolucionou. Visual meio inovador, todo colorido e com base em couro e espinho… Sistema bacana, com personagens totalmente customizaveis, ambientação dos mundos bem bacana. mas então, o que falhou ? aí teve o problema dos combos de personagens e tanta opção de customização fez aparecer os personagens de lvl 20 godkillers.
    bem, aí veio o 4.0, uma droga, feito para as ” noivas ” de MMO. Era um problema, mais pessoas deixavam o rpg de mesa para o de pc, e algo tinha de ser feito. Mas não precisavam fazer algo tão ruin, tão travado e tão limitado como está esse 4.0.
    E olha que nem falei dos alternativos d20s, ( true 20, e outros )
    Infelismente D&D não tem um histórico de game de fantasia medieval perfeito, porém dependendo da mentalidade dos jogadores e narrador, segundo a proposta da mesa, poderia ser um grande épico.
    Hoje em dia poucos gostam de jogos de fantasia medival genuinos, com elementos classicos mas uma ” pegada ” mais atual para prender os jogadores novos e velhos.
    A verdade é a que sempre existiu, cada grupo escolhe o ” game mode ” que mais adequa ao grupo, porém, ultimamente a tendencia de escolha dos grupos tem sido um game mais puxado para MMO, sistema travado e truncado, com foco em combinações de skills, builds de personagens… perfeito para PVP…
    Tudo bem, interpretação ambientação nunca foram o ponto forte de D&D.
    A sorte, é que D&D não é o único jogo de fabtasia medieval, mas é o de maior influencia e o que tende a puxar a ” tendencia ” da época.
    Vamos jogar, galera, vamos jogar.

    1. Creio que hoje em dia, sempre existirão opniões divergentes do D&D ser mesmo D&D, enfim.

      Respondendo ao tópico, os retroclones creio que sejam todos indies, exceto quando se levantados – ou comercializados – por grande editoras. Meu ver de RPG Indie são aqueles de fundo de quintal, onde o autor vai nos eventos vender o livro que ele gastou seu salário de um ano inteiro para fazer uma centena de livros. Passou para uma editora, deixou de ser indie.

      Sobre o D&D, tem muita gente que confunde Fantasia medieval de medievalismo. D&D sempre foi perfeito no quesito Fantasia Medieval, mas com as novas edições, se tornou mais Fantasia do que Medieval. E isso é ruim? Claro que não, pois foi uma evolução natural de gostos, interpretações, e de história. Muitos ainda estão com suas cabeças travadas a conceitos que normalmente se evoluem, mas para essas pessoas, deixo o desprazer das abas cobrindo os olhos, como são usados em alguns equinos. E quiçá, procurem pesquisar o que seja Alta e Baixa Fantasia.

      Muito bom o artigo!

    2. Author

      Opa Alan,

      você já trouxe a resposta pra questão no seu próprio comentário… quem faz o jogo são os jogadores!

      já passei horas discutindo regras em sistemas abertos, e já tive jogos inteiros de D&D 4a edição sem nenhuma rolagem de dados, puro roleplay.

      a questão é o que esses rpgs incentivam, e realmente às vezes acho que os d&ds novos incentivam mesmo os jogadores a só olharem pra ficha, e esquecerem de atuar e resolver problemas com a própria cabeça.

      nisso eu acho que a 3a e a 4a edição são iguais. os poderes da 4a edição não transformaram ela em MMO, porque todo o sistema de combate e skills é igual ao de 3a, ainda mais igual ao True20 e mesmo Pathfinder.

      o que faz a diferença são os jogadores, e graças a Moradin nos encontros D30 sempre encontro gente disposta a jogar e interpretar, apesar dos combates mortais, que afinal de contas é o que diverte os fãs do velho e novo D&D!

  2. Excelente artigo ML! Acho que o AD&D tinha muita coisa boa que acabou sumindo com as evoluções que a Wizards of the Coast acabou fazendo. Outra coisa que faz falta são as velhas artes de Clyde Caldwell, Larry Elmore, Jeff Easley entre outros.

    Sobre a postura do que é ou não Indie levantada pelo meu amigo Fernando acho que RPG Indie é aquele lançado até mesmo por pequenas editoras, que muitas vezes são criadas pelos próprios escritores, ou muitas vezes fãs do gênero que querem divulgar esse tipo de RPG entre a comunidade.

  3. Galera, só tenham cuidado em não ofender quem opta por um tipo de jogo. Vamos respeitar diferenças, eu mesmo não desrespeito quem optou por um jogo mais MMO ou por fazer combos. Como o ML disse, eu prefiro jogos com maior flexibilidade de background de personagem – com o sistema antigo de skills eu podia fazer um lenhador ou fazendeiro que pegou em armas para defender sua vila, por exemplo.

    Mas também havia um fator econômico: eu tenho centenas de livros de 1 e 2e, não achei qeu tinha que vender ou jogar fora tudo o que tinha (e que dá para mestrar pelos próximos 100 anos) só porque saiu uma nova edição.

    Tenbho um grupo que joga 2e e se diverte, mas é claro que tenho minhas “house rules”. Como o Ed Greenwood, que criou o Forgotten e mestra em uma versão da 2e até hoje…

  4. Opa! Gostei do site e gostei bastante a sessão de “receitas”. Boa iniciativa, hehe.
    Empolgado que sou com RPGs independentes, comprei o Old Dragon para ver como funciona o sistema. Gostei muito, muito mesmo, mas tenho uma série de ressalvas a fazer (provavelmente vai virar um post lá no rpgdm).
    Sobre a pergunta do título, acho que OD não é um D&D ‘DA’ velha garda; antes que isso, ele é um D&D ‘SOBRE’ a velha guarda, até porque todo mundo que eu conheço que curte AD&D continua jogando AD&D. OD é para jogadores novos que não morderam a isca do Boardgame da Wizards.

    1. Author

      rapaz, é uma idéia interessante mesmo, Old Dragon seria um D&D old school para as novas massas 🙂

  5. “…enquanto o irmão dele, que joga old school só porque não teve tempo de aprender as novidades, ainda joga AD&D 1a edição.”

    Na realidade, ML, em defesa do irmão, jogo terceira edição (e gosto), mas saltei a 2a edição e ainda não decidi o que penso a respeito da 4a edição.

    AD&D 1a edição era medieval Fanastico, em partes mais ou menos iguais. A 2a edição puxou o lado fantástico muito longe, ficava difícil rodar uma campanha low magic. Muitos se queixam da 1a edição engessar as opções dos jogadores, com classes rígidas e tal. Não há nada mais socialmente rígido do que uma sociedade medieval… já uma campanha High Magic ou muito fantástica requer muito mais flexibilidade, para incluir todos os Half-ogre, half-elemental infernal bugbears que os mestres e os ,ini,axers quisessem… eu acho que quanto mais fantástico o jogo, mais difícil é enfatizar o drama natural da condição humana: o medo, a cobiça, o ódio e o amor que faz da existência algo impressionante. Daí a minha continuada fascinação com o D&D e o AD&D 1a edição… menos ênfase nas regras e na mecânica, e muito mais ênfase no ‘milieu’ e nas relações sociais. Tendo dito isso, o sistema era engessado mesmo, e era difícil jogar um outro tipo de campanha fantástica do que aquela imaginada por EGG: um pre-war Greyhawk, sem invasões de demônios e tudo isso. E foi por isso que quando o Forgotten Realms — originalmente concebido na 1a edição — começou a vender, decidiram atualizar o sistema para melhor acomodar a campanha que mais vendia… enfim, ramblings of an old man.

    1. Author

      Não sei se você leu o artigo sobre Old School D&D, acho ele bem legal para arejar as idéias… tem jogado por aí? sempre digo isso, mas precisamos jogar quando estiver aqui!

      1. Estou por aqui, e joguei um pouquinho de 4a edição com o Pai Thomas, semana passada. Lerei o artigo sobre old school, ainda não o fiz. Temos mesmo que jogar, mas vai ser da próxima vez que eu vier, em alguns meses… por lá não tenho jogado nada, infelizmente.

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